sexta-feira, 6 de julho de 2007

Poema para o Rio

Poema para o Rio:
Eu bebo copos e copos de café em salas ar condicionadas
Em tardes estúpidas e ensolaradas esperando ansiosamente por
Temporais anunciados no céu
Sento à janela
Fumo cigarros
E entre cigarros e trovoadas distantes e raios e copos
Eu, imóvel, penso
Eu imóvel, denso
Eu imóvel
Café passado
Café presente
Café futuro
Pela janela
A guerra travada entre o azul e o azul escuro
Entre o broto e o muro
Entre o músculo e o prematuro
Então chove
Chove incessantemente
Como se as cataratas do universo houvessem decidido
Pairar sobre minha casa
Como se os rios de deus desaguassem todos
Na minha rua
Rua Marquês de Olinda, Botafogo, Guanabara
Chove por dias
Eu sigo calado, um pouco morto um pouco derrotado,
Mas desistir jamais
Bandeira branca eu quero paz! – quanta balela
A paz não existe enquanto há tanta água
Tanta guerra
E quem sou senão esse corpo que resiste
Como limite ao turbilhão interior
E os planos
Ah meus planos
Pai de meus desenganos
Malditos planos
Que me deixam perdido
Nessa suposição de que existe o futuro e pior que o futuro
É esse tal do futuro do pretérito que me deixa louco
Seria, teria, iria, diria, faria
Mas o tempo passa e eu acabo não sendo
Não tendo, não indo, não dizendo o que queria
Fazendo pouco
Fazendo ao contrário à vida
Contra a corrente desse rio que corre
Pela epiderme, enchendo minhas veias
Escorrendo
Por meus braços, pernas, membros
Meus olhos na janela
Assustados
Mas bem abertos
Como olhos de criança
Curiosos
Tementes
Pelos sins e nãos que minha mãe ainda me diz
Sob o teto cada vez mais baixo de minha casa
Eu a vejo na frente da TV
Dizendo sim
Dizendo não
Alimentando-me
Vestindo-me
Eu o broto o muro
A janela o furo
Pelo qual espio
Eu Rio
Imóvel no meu canto fumo
Bebo cafés e cafés enquanto a água escorre
Deságua o mundo
E eu no fundo eu sei que não vale a pena
Mergulhar em vidas alheias
Eu sei que não vale a pena o futuro do passado
Essa maldita conjugação verbal
Nenhuma professora do primário secundário e do terceiro grau
Jamais compreendeu
O meu estupro cultural
Eu sigo o caminho do bem e o caminho do mal
E ela me pergunta o que eu faria se tivesse 6 meses de vida e eu a digo
Que eu correria
Minhas pernas contra o ar
Como locomotiva
Na contramão do mundo
Mas não por muito tempo
Pois para reinar sobre o tempo
Basta saber-me atemporal
E então mesmo assim tão mal
Eu acho uma saída
No sitio do pica-pau de minha vida
Pirlimpimpim e eis aqui
A minha ressurreição
Chove escorre o rio deságua
Eu janela broto muro azul escuro tudo escuro nasce desce prematuro
Cede o músculo
Eu, Rio
Eis aqui
A minha ressurreição
Rodrigo Barata