domingo, 17 de agosto de 2008

Rocket Boy

O menino estourou pela porta do carro
Cambaleou
Tropeçou
Mas não caiu

Ele riu mais do que todo mundo
Eu não ri, mas sorri orgulhoso

Ao ver o menino tropeçando

Pois tropeçar é preciso
E dizer “não”
É preciso dizer não

À precisão do passo
À falsa segurança que sequer nos livra
Do despudor do embaraço


E ninguém soube e nem jamais saberá
Que menino estava feliz
Talvez por saber que por um triz
Recuperou o passo
Desafiou o compasso e

Fez aquilo que faz o ser humano ao ser humano
Dizendo não a quem exige compreensão
-quem berra, perde a questão

Dizendo não assim
Ao terrorismo da razão
Fazendo compreender
O menino fez a si compreendido

Só isso faz sentido para quem vive a favor da vida

E eu sei que ele há de acordar por dias, infeliz,
E dolorido
Eu também hei, haveremos todos

Mas que saiba o menino e que eu não me esqueça
Que a vida recompensa
Quem faz ou quem fez
De acordo com o que se pensa

Quem respeita as estações
Quem não repete orações

Viver é uma forma de oração

Quando se permite tropeçar
Quando se aprende a dizer sim ao sim
E não ao não

Eu vi o menino estourando pela porta do carro
Na contramão
Se colocando ao quase-cair em sintonia com o que o universo conspirou

O que o viver de cada um acumulou
Até virar a sabedoria que se tangencia
Entre o anoitecer
E o raiar de um novo dia

E que se coloca disponível a quem se permite sonhar
A quem se permite não estar sempre tão certo
A quem respeita o incerto e entende que nem tudo é o que parece

Nem tudo o que sobe desce

Quem se atreve
A desafiar a gravidade

Sabe e entende
O que é ser leve

E que o menino releve e compreenda que sim de fato faz sentido
Sonhar acordado
Ser meio tarado e viver por um triz

Infeliz quem não espera que a vida o desafie
Naquilo que cegamente confie
Naquilo que sonhou
Naquilo que quis


Drigo

All I know is that I know nothing

E então
Eu páro e meus olhos fitam
Em busca de compreensão

E de tanto fitar se cansam a saber que,

Mais que meu querer
Mais do que entender
O que se fez
Ou não se fez

Ao completar-se um ano

Importa ser
Mais oceano
E aceitar-se errático
Por mais que eu me perceba

Matemático,

Eu aceito por fim
O inesperado, o acidental
E o poder subliminal
Da imaginação


Quem espera resposta ao calcular
Esquece-se de respirar e não se dá conta que

A matemática é mera linguagem
Imagem do verdadeiro, mas...
Não oferece solução

E o que importa na verdade
É que a falta de compreensão
Faz-me e faz a ti
Mais sãos.

E à cada peça que clama por outra peça
Para que encaixe

Eu digo não

E eu reconheço que isso incomoda e quase peço que me esqueçam
Pois me faz assim mais suportável esse cansaço
Eu que sou carne e não sou aço

Tanto penso
Tão pouco faço

Mas eu não me encaixo mesmo,
Eu sigo sendo
Ladeira abaixo
Por gravidade

F=m.a


Na física de quem raciocina

Como se a esquina
Oferecesse
A resposta

Como se a menina
Oferecesse
A resposta

Como se perguntar garantisse
Exata explicação

Eu digo de antemão
Que não há
Explicação

Por que se ama um homem
Ou uma mulher e o porquê
Da supremacia ocidental
Do garfo e faca

Sobre a colher

A compreensão é uma utopia
A alma humana é vagabunda e vadia
E aleatória

E a história uma invenção
Diz-se e se escreve o que se quer
E no fim ninguém entende
Por que se insiste
Na dor
Que contagia

Sofre tanto o filho da puta
Que a dor imputa
Quanto quem em busca de sentido

Dói na luta
Ao ser infligido

A dor gera sanidade
E a idade
Humana ou sobre-humana
Encaminha-nos

Na busca por verdade
Obvia a maldade em quem serve ao ego

A luz que não estimula no cego a visão

acalenta-lhe
O coração

Um conforto que transcende a compreensão
Faz-lhe intuir

Mais do que nós que vemos e,
Que por não ser esse poema em Braille

Aqui o lemos

Desatando os nós
Que uma vez desatados
Transformam-se

Em novos nós.
E faz-nos de tanto amor, desejo e inteligência.

Montes de pó em pró

Da angústia de uma ciência
Que tão pouco entende


E eu
Que pareço um louco
Ao admitir

Que sou tão pouco

Que sei tão pouco.

Me calo e deixo o sol nascer
O galo cantar
E o dia acontecer

Drigo

sábado, 2 de agosto de 2008

Dois de Agosto, Dois Mil e Oito, que foi assim.

O dia serenou quando meu pai chamou
E disse: Filho vamos tomar um pouco de sol
Teu coração aflito já levou pito e segurou o grito
Já desejou demais neste quarto escuro
Nessa tela de computador

Vamos para a rua
O sol segue brilhando e a lua
Vai refletir do mesmo jeito
Quer te aflijas
Quer não

Meu pai é um amigo que tenho
Meu pai é empenho em me amar
Meu pai serenou o meu coração
Num dia de cão
Que agora já parece até agradável

Eu tão pouco sociável
Há dias não sentia que a cidade
Ia acontecendo com a mesma indiferença
A cidade é uma fotografia

Quando você acha o sentido
Ela já não faz sentido
Quando tanto é dito por tanta gente
E tanto é mentido ou assumido como verdade
Fica difícil não generalizar e banalizar e marginalizar
Há de se justificar a cidade afinal

E tanto sentimento é oprimido por preguiça
De elaborar um pouco mais
Afim de que não se deixe pra trás
A chance de acontecer

E a vida não é só tristeza nem e só alegria
A vida se faz tropeçando
Parando
Recomeçando ao meio dia
Às três da tarde
Recomeçando por ordem das nuances, dos sorrisos inesperados
Recomeçando pois só a morte encerra
E a vida berra por redimir um dia de cão

Ainda que tardia
A vida clama por redenção

Minha sobrinha coroou a redenção deste dia
Ao me olhar um sorriso
Que sorri quem sabe que só o amor cria
Ela ama
Simplesmente ama e

Ela tem que crescer e ocupar espaço e para tanto
Seu instrumento é o amor
O seu desejo é amar

E agora o sol vai se por e a mente começa a divagar eu sou uma prece
A cortina desce
E é quando escurece que vejo
O quanto se quis

De tanto desejar eu me tornei desejo
Um beijo frustrado
Que agora
Neste momento sereno

Encontra a alegria em ouvir a menina aprendendo a falar
Ao saber-se possível
Perdoar
E se perdoar

Ao entender que o desejar não é assim tão ruim
O desejo ensina a amar
E a paciência com quem acha que pode mandar no dia ...
Há de haver paciência com quem pensa assim

E há de se saber que no fim das contas
Cada um com a sua razão

Mais vale um coração sereno
E a imensurável gratidão
A um pai que se chama devoção
E a um amigo que me deu a mão e cuidou do plano que não vai esvair
A uma criança que me impede de ir
A uma mãe que ama e supera tanta certeza
Transcende a razão que lhe é tão cara
Por que sente
Que a vida não pára
Que a harmonia é lapidada
Como uma jóia rara
Com muita aceitação
Com boa vontade
Com a serenidade que é um tapa de luva na cara de quem grita e exige explicação
Quem não corrompe o coração por medo ou vaidade
Recupera a paz, mantém a dignidade
E cala a boca suja da cidade que é uma entidade egocêntrica
Que por tanto demandar a coerência que lhe confere efêmero sentido
Acaba não respeitando ninguém.

Drigo